Sobre a briga entre Paulo Guedes e Rodrigo Maia…

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Por Thiago Espindula

Um dos assuntos que tomaram conta do noticiário, no dia de hoje, foi o suposto desentendimento entre Rodrigo Maia e Paulo Guedes em função da discussão sobre as reformas levadas a cabo pelo governo de Jair Bolsonaro. A pauta do momento é a reforma administrativa, que deve fazer uma série de transformações no tratamento do funcionalismo público e que teria levado a algumas divergências pontuais entre o Presidente da Câmara dos Deputados e o Ministro da Economia.

Sobre a reforma administrativa, ela se propõe a atacar vários direitos dos funcionários públicos, que o governo vê como gastos desnecessários, argumentando que ela ataca privilégios do setor público para que seja possível manter as contas públicas em dia. O contraditório da situação é que a reforma diz atacar privilégios, mas deixa de fora servidores do Legislativo, do Judiciário e do setor militar, o que significa que inúmeros privilegiados ficarão de fora das transformações propostas por Guedes. Esse fato só pode nos levar à conclusão de que o principal objetivo do governo é atacar os trabalhadores do setor público, mas manter intactos as mordomias gozadas por vários servidores do setor… E mesmo que alguns cortes sejam propostos para esses setores mais favorecidos, ficará claro que isso deverá ser uma moeda de troca para sustentar cortes de direitos do funcionalismo público, posto que não fazia parte do projeto inicial.

O argumento central da reforma, para atenuar a tensão que pode vir a ser gerada com a população brasileira, é de que ela não atinge os servidores que já estão atuando, e sim os novos que venham a ser contratados ou concursados. Porém, é preciso lembrar que o custo da crise econômica será apresentado ao povo como sendo uma fatura de gastos com o covid-19 (como se eles tivessem realmente ocorrido), o que deve servir como desculpa para uma rodada de austeridade que será apresentada pelo governo. Precisamos ter muito claro diante de nós que, num futuro próximo, todos os cortes serão “uma necessidade em função de tudo que ocorreu durante a pandemia”. Dentro dessa conjuntura, o funcionalismo será atacado e várias demissões irão ocorrer, ainda que isso pareça algo inconstitucional se observado sob circunstâncias normais (o problema é que as circunstâncias já não são mais normais há muito tempo no Brasil). A tendência é de que muitos servidores públicos venham a ser cortados nos próximos tempos e de que as novas vagas, já com direitos reduzidos, venham a ser colocadas como opção, fazendo com que o governo busque superávits sobre as costas dos servidores.

É preciso lembrar que cortes no funcionalismo público, pelo fato desse setor compor consideráveis estratos das camadas melhor remuneradas da sociedade, deve levar a uma redução do mercado consumidor brasileiro, uma vez que o dinheiro na mão da população tende a encolher. Isso, em efeito dominó, levará a inúmeras reduções e falências de pequenos e médios negócios que oferecem produtos e serviços para as camadas médias consumidoras da nossa sociedade, o que tende a desaguar em mais uma rodada de perda de empregos e reduções de salários. É preciso lembrar que a maior parte dos empregos no Brasil é gerada por pequenas e médias empresas, altamente suscetíveis a flutuações no mercado consumidor, fato que deve nos alertar para a necessidade de demonstrar para pequenos e médios empreendedores que a questão da defesa do funcionalismo público também é um problema seu. Não podemos esquecer que os cortes do funcionalismo serão operados no sentido de produzir sobras para que a dívida pública possa ser paga a banqueiros e financistas, que, com certeza, não comprarão nos negócios da classe média brasileira.

Devidamente apresentado o cenário da reforma administrativa, nos cabe agora falar a respeito do objetivo político das ditas divergências entre Guedes e Maia, posto que o cenário no qual elas teriam hipoteticamente ocorrido seria o dessa reforma. Segundo várias matérias, o Presidente da Câmara e o Ministro da Economia não estariam se falando em função de inúmeras divergências que estão ocorrendo durante as reformas propostas pelo governo Bolsonaro. Porém, precisamos nos atentar para o fato de que a estratégia de apresentar brigas internas no governo tem sido utilizada de maneira constante para conseguir vitórias políticas sobre a oposição e diante da mídia, como se algo teatral fosse elaborado para encenar um enredo no qual, no final, a concordância é atingida e a reforma é aprovada. Com isso não quero dizer que não possa haver uma real divergência pontual ou uma disputa para ver quem será o cachorrinho mais fiel da elite transnacional, mas sim que essa disputa nada tem de produtiva para o povo, posto que não é uma real luta de concepções divergentes.

O fato de agora não é diferente das supostas brigas encenadas entre Guedes e os ditos militares protecionistas, nas quais Paulo Guedes estaria ficando isolado e prestes a cair, para no final tudo ficar “por isso mesmo” e todo o pacote neoliberal seguir avançando tranquilamente. Lembram de todos os episódios protagonizados por Braga Netto, que estaria em divergência direta com Guedes? No meio disso tudo, não estão os desmontes do patrimônio ocorrendo a toque de caixa, como percebemos no caso da Petrobras e da Eletrobras? Mesmo com todas as falsas diferenças entre Bolsonaro e Rodrigo Maia, não foi a reforma da Previdência aprovada a despeito de todos os ataques que simboliza contra o trabalhador? Quantas vezes os canais ditos progressistas já não profetizaram impeachments, quedas e renúncias, que no final não deram em nada no governo Bolsonaro?

Ao que tudo indica, o atual governo tem percebido que é funcional o método de promover um aparente caos de divergências internas para manter uma governabilidade baseada na ideia de que a direita atua como situação e como oposição ao mesmo tempo, o que serve para sequestrar qualquer pauta que a esquerda poderia (e deveria) propor. Afinal de contas, para que ter oposição se Maia já rivaliza com Paulo Guedes, não é mesmo? No meio dessa situação, a esquerda se vê na situação de apoiar tudo que não seja o Bolsonaro, o que normalmente a coloca ao lado de figuras como o próprio Rodrigo Maia, como já vimos as mídias de esquerda fazer inúmeras vezes (apresentando essa figura neoliberal como “o adulto na sala”). É interessante apreender essa metodologia da direita brasileira, na qual o projeto único e já tramado de antemão simula uma divergência interna para enganar a torcida, e termina com uma aprovação que atende a todos os interesses da burguesia, com uma oposição que ainda pensa ter extraído do governo uma espécie de meio-termo.

O governo Bolsonaro segue aplicando o método de bolar, de antemão, toda a disputa que deveria ocorrer durante o processo de aprovação de uma reforma, antecipando inclusive os papéis que deveriam ser cumpridos pela esquerda, que, perdida e apática, acaba ficando apenas com a opção de aderir a um ou outro lado das direitas que representam, no final, o mesmo interesse, que é o da burguesia transnacional. É por isso que já devemos também saber antecipadamente: a “briga” entre Guedes e Maia deve levar, invariavelmente, à vitória da burguesia e à derrota do povo.

A seguir, vídeo discutindo o assunto abordado no texto.

Com informações Verdade Concreta


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