Sobre a entrega da Eletrobras e a Greve dos Correios…

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Por Thiago Espindula

De ontem para hoje, dois temas se levantam como fundamentais na ordem do dia: a entrega fracionada da Eletrobras para a iniciativa privada e a greve dos trabalhadores dos Correios. É preciso dizer que, muito embora o debate sobre a Sara Winter esteja ainda absorvendo muita energia do progressismo, talvez seja importante se desvencilhar dessa discussão que pode ter sido uma cortina de fumaça para encobrir questões mais centrais para os brasileiros.

O que tem ficado claro nos processos de entrega do patrimônio público por parte do governo Bolsonaro é o mais absoluto encobrimento dos caminhos seguidos e a ausência completa de debate público para se efetuar as privatizações, o que dá ao governo o aspecto de grupo político que sempre age na calada da noite… E quem age na calada da noite só pode estar fazendo coisa errada, é o que nos aponta a experiência popular. Seria necessário um amplo debate da sociedade sobre a situação das empresas públicas, com adequada divulgação de dados e argumentos, antes que se pudesse tomar qualquer decisão no que diz respeito a uma maquinaria que pertence à sociedade brasileira. Ao invés disso, o governo aproveita a situação do país e a falta de tempo e de acesso à informação da sociedade para rifar a custos baixíssimos o aparelho público brasileiro.

Um exemplo disso foi a entrega de um parque eólico da Eletrobras, anunciada ontem, a um valor que corresponde a cerca de 20% do valor real, o que representa uma clara ação de destruição e saque do patrimônio que pertence aos brasileiros. Sobre isso, é interessante observar como Bolsonaro se portou quando Fernando Henrique Cardoso entregou a Companhia Vale do Rio Doce para a iniciativa estrangeira a preços irrisórios: naquele momento, o ex-capitão disse que era um crime contra o país e que FHC merecia tomar um tiro pelo que fez. O interessante é que o tempo passa, e hoje Jair Bolsonaro se vê cumprindo o mesmo papel que o PSDB cumpriu naquele momento, que é o de agir para ampliar os privilégios dos ricos e favorecer os interesses das elites nacionais e transnacionais.

Diga-se de passagem, a prática da atual gestão federal tem sido a de promover a entrega fracionada do patrimônio e a ação na calada da noite, o que fica patente no caso da destruição da Petrobras, na qual Rodrigo Maia decidiu como legítimo promover o desmonte gradual da empresa para evitar que o processo passe pelo Congresso e produza um debate público. Com isso, não quero dizer que o Congresso agiria de maneira contrário ao governo Bolsonaro, posto que também é um antro da burguesia utilizando o Estado para atender aos seus próprios interesses empresariais; porém, creio que o movimento de debate no Congresso abriria possibilidade para a oposição conseguir amplificar para o povo o tema das privatizações. Também é preciso perceber que, muito embora exista uma impressão, distorcida por causa das redes sociais, de que os brasileiros são a favor da privatização, pesquisas já demonstraram que a população é amplamente favorável e atribui ao Estado uma função central.

Voltando ao caso da Eletrobras, é importante que lembremos que, durante a década de 1990, houve a compreensão de que privatizar porções do setor elétrico seria o melhor para o país, e no final tudo acabou em um enorme apagão ocorrido em 2001. Isso era esperado, posto que os custos de obras infraestruturais são altíssimos e o retorno é bastante demorado, o que inviabiliza a ideia de se crer que a iniciativa privada irá conseguir alavancar a qualidade dos serviços. No final das contas, os investimentos não foram feitos, a luz ficou mais cara e as empresas, logicamente, pensaram apenas no seu lucro, deixando a qualidade do serviço em segundo plano. Lembremos que também no setor da infraestrutura rodoviária, durante a década de 1990, não aconteceu nada muito diferente: as obras não foram feitas, pedágios foram instalados e, no final, o Estado teve que reassumir trechos para promover obras. Temos as mesmas tendências se apresentando para os próximos tempos.

No que tange ao caso dos Correios, os trabalhadores da empresa estão de greve em função da perda de alguns direitos, da situação à qual estão sendo expostos durante a pandemia e também por causa do risco iminente de privatização da empresa. Este último fator amarra-se ao tema geral do texto, e faz dos Correios mais uma empresa sob o risco de ataque pesado dos interesses da elite para serem entregues à iniciativa privada. Para abrirmos essa discussão, precisamos lembrar que, se voltarmos 10 anos na história, encontraremos uma empresa pública altamente elogiada e bem avaliada nas pesquisas de satisfação, o que mudou nos últimos anos, quando a empresa passou a ser alvo de sucateamento para levar a população a concordar com uma possível privatização… “Modus operandi” habitual do sistema quando quer entregar uma empresa pública à iniciativa privada com a anuência do povo.

Lembremos que os Correios atendem a diversas cidades, muitas das quais com agências nada rentáveis e que são supridas pelo orçamento excedente extraído de agências de cidades maiores. Caso a empresa venha a ser privatizada, é evidente que muitos brasileiros ficarão sem um atendimento mínimo de entrega de correspondências e objetos por parte de uma empresa que não possui o monopólio de entrega de mercadorias, como muitos gostam de ressaltar. Nesse quesito, os Correios apresentam apenas o monopólio da entrega de correspondências, ficando o mercado para entrega de objetos aberto, o que significa que, se muitas pessoas veem os Correios como a única opção nas cidades ou bairros onde moram, é porque a iniciativa privada não achou a entrega rentável. Sem os Correios, essas pessoas não teriam acesso a qualquer forma de entrega. Além disso, o que a iniciativa privada quer é tentar comprar barato uma estrutura construída pela iniciativa pública para não ter que arcar com os investimentos para constituir uma empresa competitiva.

Por fim, cabe que ressaltar que muitos países promoveram a privatização dos serviços postais, e tiveram que voltar atrás na decisão devolvendo para o Estado a função, posto que muitas pessoas acabaram ficando desassistidas pelo serviço. Nos Estados Unidos, muito embora existam inúmeras empresas privadas responsáveis pelo serviço postal e de entregas, existe também um setor público responsável por fazer as entregas chegarem a várias localidades. No caso brasileiro, existe uma simbiose entre as agências de cidades maiores e as de cidades menores, para que todos os brasileiros possam ter acesso a serviços de entregas, o que ficaria comprometido caso o governo levasse a frente a privatização, entregando a parte rentável para os empresários e o ônus à sociedade.

A seguir, vídeo discutindo o assunto tratado no texto.

Com informações Verdade Concreta


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